quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Gangs of New York - The Blood stays on the blade


Gangs of New York, está longe de ser um filme consensual. Despertou muitas indiferenças e muita falta de compreensão. É sem dúvida um filme anti-climático, com um cem número de histórias a acontecer a todo o momento. Para mim foi uma enorme descoberta, um filme que me deixou sem respiração. É como um tratado visual, em que em cada plano conseguimos encontrar uma história e a história do filme:
É ver as ruas cheias de pessoas de todas as origens, em que as musicas se fundem. É ver a sede do partido, em que Bill (Daniel Day-Lewis) discute com o líder do partido, numa sala cheia de gaiolas de pássaros, que mostram a prisão de luxo em que esse líder vive. Ou todos os planos com a bandeira americana.





Longe das paisagens míticas do oeste, Scorsese construiu o Eastern. Género de um filme só, mas cujos códigos são os mesmos do Oeste. Nele vemos o herói que se quer vingar, a heroína que o ama e o vilão que é a alternativa à lei. A aparente simplicidade de propósitos dos protagonistas (e a sua linearidade) são um choque com tudo o que acontece à sua volta e servem o propósito de realçar essa América que está a nascer.
No inicio o Priest Vallon (Liam Neeson) diz para o seu filho (Leonardo DiCaprio) - The blood stays on the blade.
Esse é todo o propósito do filme, mostra que a cidade não é feita de prédios e ruas, mas de camadas e camadas de sangue e corpos que a revestem… essa é a sua memória, é aí que se encontram as suas histórias. O massacre no final do filme é a ilustração visual dessa cidade/país lamina, com o sangue a cobrir as ruas. A sua iconografia é a do esventramento, das lâminas, do sangue. Uma América espectáculo, assistimos a teatros, musicas, circo, a politica, o boxe, os sacrifícios públicos e mesmo um assassinato… Aliás esse é um momento brilhante de distanciamento irónico – Bill mata Monk (Brendan Gleeson) com a sua própria moca, após o qual vira-se para nós, o seu publico, e faz uma vénia, acabando o plano com aplausos que colam com a sequência seguinte. Nesse momento, funde-se a violência e o espectáculo e é como se a narrativa parasse e Bill nos confrontasse directamente com o seu acto, obrigando-nos a partilhar e aplaudir.



Cada plano é como uma nódoa de sangue que forma todo o filme, cada pedaço fundamental para essa tapeçaria. No final, fica apenas a impressão de termos assistido ao enorme caldeirão contraditório e primitivo, à civilização antes dela existir. Por isso, o excesso, a teatralização e os rituais de violência.
Mas o que acontece aos protagonistas que nos levam por este turbilhão de acontecimentos?... eles mesmos são esmagados por forças maiores. A História (com H ) sobrepõe-se, e no momento do ajuste final, a cidade engole-os, e percebemos, tal como o protagonista, o pequeno que ele é. Apenas mais uma gota nesse enorme oceano vermelho.

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